O
que nos faz escrever um pouco sobre este tema é a nossa constatação um pouco
espantada acerca de posições de velhos amigos que são externadas mais intensa e
autenticamente graças à arena comunicacional do Facebook. Em política,
radicalismos à esquerda e à direita; no futebol, um passionalismo violento e
por vezes até “desnecessariamente” chulo; e em religião, a sustentação de
dogmas há muito derrubados por pessoas que nos surpreendem por sabermos de sua
formação e histórico. São opiniões, bandeiras, direcionamentos que, no fundo,
no fundo, falam muito pouco de argumentação ou racionalização, mas antes de
identificação.Vamos explorar um pouco. A identificação é um fenômeno psíquico
que serve para pelo menos duas coisas:
-
qualificar o meu Ego com atributos que detecto no meu objeto de amor, para que
eu possa ser amado por mim mesmo, onde “mim mesmo” = Id + Ego + Superego;
-
auxiliar no recalque de conteúdos inconscientes negando atributos que são a
própria expressão daquilo que me é mais intenso e conscientemente indesejável e
condenável.
Nossa
preocupação em publicar este post justifica-se na medida em que este ano será
de intensas paixões: o futebol com a Copa e suas diversas polêmicas possíveis,
e a religião e a política, cada vez mais miscíveis nas confusas correntes
partidárias que procuram associar moral religiosa com retidão de caráter ou o
que quer que seja. O que já estamos vendo é o enorme investimento de energia
das pessoas em assegurar que o seu narcisismo primário seja preservado a todo
custo, com a assunção de posições cristalizadas, manutenção de maniqueísmos
artificiais e a utilização de argumentos assentados em bases cada vez mais
frágeis. Tememos, pois, que a estrutura imatura da nossa sociedade nos reserve
momentos de violência inéditos, especialmente no campo da política, onde o voto
- que, convenhamos, é sinônimo de desejo - carrega um intenso lastro de associação e de
solidariedade à figura de uma pessoa ou instituição imaginária - um produto a ser
vendido durante a eleição.E também imaginárias, mas muito intensas, têm sido as
manifestações de defesa e de rejeição a este ou aquele ícone ou instituição que temos testemunhado até mesmo em nosso
círculo de convivência. Um investimento de energia compatível com o que se
supõe ter ocorrido em ambientes pré revolucionários ou como reação a regimes
absolutistas. Parece-nos, portanto, que tempos complicados se avizinham, pois,
como diz aquele provérbio ruandês: "Você pode se distanciar de quem está
correndo atrás de você! Mas, não do que está correndo dentro de você!"